AUMENTO DO ICMS NA SAÚDE É MEDIDA INCONSTITUCIONAL E CONTRÁRIA À VIDA

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Diante dos efeitos gerados pela pandemia da Covid-19, o governo do estado de São Paulo adotou determinadas medidas econômicas, por meio da edição da Lei nº 17.293/2000, que, em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), estabeleceu, em seu artigo 22, que fica o Poder Executivo autorizado a reduzir os benefícios fiscais e financeiros-fiscais relacionados, na forma do Convênio ICMS nº 42/2006.

Na mesma data, o governo paulista publicou o Decreto nº 65.254/2020, que revogou o Convênio ICMS nº 01/1999 durante a sua vigência, convênio este renovado unanimemente pelos estados e pelo Distrito Federal desde a sua criação, há mais de duas décadas, que estabelece importante isenção de ICMS para equipamentos e insumos médicos. De forma infeliz, o governo paulista não apenas reduziu o benefício da isenção de ICMS para equipamentos e insumos médicos, mas o suprimiu completamente, restringindo sua aplicação a hospitais públicos e Santas Casas, o que extrapola a própria Lei nº 17.293/2020.

Esse decreto, além de ser ilegal e inconstitucional, gera aumento inesperado de carga tributária da ordem de 21,95% no valor de equipamentos e insumos médicos, especialmente aqueles destinados ao tratamento de diálise e transplante, gerando efeitos devastadores às clínicas de diálise do Estado, a imensa maioria prestadora de relevantes e, principalmente, essenciais serviços ao Sistema Único de Saúde (SUS). Uma atividade que o Estado brasileiro só consegue oferecer aos seus cidadãos através desses estabelecimentos, remunerados com base em valores fixos tabelados pelo Ministério da Saúde, valores estes de aplicação, no mínimo, anual, e que estão longe de refletir os verdadeiros custos das sessões de diálise.

A Lei Complementar nº 24/1975, que é a indicada pela alínea “g” do inciso XII do §2º do artigo 155 da Constituição Federal (CF/1988) para dispor como, mediante deliberação dos estados e do Distrito Federal, benefícios fiscais serão concedidos ou revogados, estabelece quórum qualificado de 4/5 dos presentes em reunião específica do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) para a revogação de isenção, e não por simples decreto unilateralmente criado pelo governo paulista.

Além de o governo paulista ter revogado a isenção a equipamentos e insumos médicos sem qualquer lastro na própria Lei Paulista nº 17.293/2020, nem ter observado a regra da Lei Complementar nº 24/1975, o Decreto nº 65.254/2020 também ofende o denominado princípio da legalidade, previsto no inciso I do artigo 150 da CF/1988, que exige lei, criada pelo Poder Legislativo, para qualquer aumento de tributos, e não um simples decreto definido pelo chefe do Poder Executivo.

E como se não bastassem tais ilegalidades e inconstitucionalidades evidentes, o governo paulista ainda modificou uma isenção a equipamentos e insumos médicos, criada justamente para tornar mais acessível o atendimento de saúde, um dever social previsto na Constituição. Lembrando que os hospitais públicos e as Santas Casas, beneficiados pela medida, se encontram na mesma situação das clínicas de diálise, pois prestam serviços aos SUS, não com a mesma expertise desses estabelecimentos na área de diálise e transplante.

Uma vez que tal alteração não encontra sequer embasamento no próprio Convênio ICMS nº 01/1999, o que constitui nova inconstitucionalidade, o governo paulista ofende o inciso II do artigo 150 e o artigo 152 da CF, que vedam a instituição de tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente (princípio da isonomia tributária) e vedam a criação de diferenciação tributária em relação ao destino. Daí porque nunca o governo paulista poderia restringir essa isenção.

Em suma, ao revogar ilegal e inconstitucionalmente a disposição do Convênio ICMS nº 01/1999, o governo paulista modifica regime tributário vigente há mais de 20 anos — mesmo tendo arrecadado mais em 2020 do que em 2019 —, voltado para a saúde, mais especificamente, ao essencial e especializado setor de diálise e transplante. Tudo isso sob o risco de consequência social de grandes proporções, ao gerar aumento imediato de 21,9% sobre equipamentos e insumos médicos, comprometendo a combalida saúde financeira das clínicas de diálise em todo o Brasil e colocando em risco o atendimento de 140 mil de pacientes renais crônicos cuja vida, um direito fundamental na Constituição, depende exclusivamente do tratamento de diálise ou do transplante.

Fonte: Conjur – https://www.conjur.com.br/2021-ago-12/sawaya-vieira-aumento-icms-saude