Por YUSSIF ALI MERE JR, presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT), presidente do Sindicato e Federação dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (SINDHOSP e da FEHOESP)
Encerramos 2019 com motivos para comemorar. A aprovação da reforma da Previdência, a queda da taxa básica de juros, num patamar nunca visto antes no Brasil, e o avanço da economia de 0,6% no 3º trimestre na comparação com o período anterior, segundo dados divulgados pelo IBGE em dezembro. Esse crescimento econômico foi puxado, principalmente, pela iniciativa privada, o que é significativo e mostra a força motora do setor empresarial, que passa a investir e produzir mais, dando sinais de que a recessão aos poucos vai ficando para trás. Claro, ainda temos 12,4 milhões de desempregados, problema grave que precisamos enfrentar rapidamente, pois não existe dignidade humana sem sustento, sem trabalho.
Paralelamente a esses avanços econômicos, o país perdeu posição no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), de acordo com relatório divulgado recentemente pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), baseado em dados de 2018. Atualmente ocupamos a 79ª posição entre 189 nações, ranking semelhante ao da Colômbia, Argélia e Tailândia. O Pnud mediu, também, a distribuição de renda entre a população e nesse quesito o desempenho brasileiro foi péssimo: temos a 2ª maior concentração de renda do mundo, ficando atrás apenas do Catar.
O desenvolvimento econômico precisa caminhar lado a lado ao desenvolvimento social. A saúde é um setor economicamente importante, que movimenta cerca de 9% do Produto Interno Bruto (PIB), e está ligada diretamente ao social, assim como a educação. Não faltam constrangimentos e dificuldades enfrentadas no Sistema Único de Saúde (SUS), devido ao subfinanciamento. No caso da diálise, 123 mil brasileiros recebem a Terapia Renal Substitutiva (TRS) em 754 clínicas de diálise pelo país, sendo mais de 80% do setor privado. Ao mesmo tempo em que essas clínicas garantem a sobrevivência dos pacientes, elas amargam dificuldades financeiras em função da falta de repasses e do déficit no valor das sessões de hemodiálise, sem sequer enxergar no horizonte ajustes e investimentos.
A recente crise da saúde deflagrada no Rio de Janeiro é outro claro exemplo desse cenário marcado por caos e desrespeito à vida humana. Mesmo assim, a Comissão da Câmara dos Deputados que analisa o orçamento de 2020 decidiu tirar R$ 500 milhões do Ministério da Saúde para financiar as campanhas municipais do próximo ano. Tirar meio bilhão de reais da saúde, com todas as dificuldades do SUS é, no mínimo, governar de costas para a sociedade, que esses deputados foram eleitos para representar.
Um ditado popular diz que devemos “fritar o peixe de olho no gato”. A política brasileira, infelizmente, funciona assim. A sociedade precisa encontrar meios mais eficientes para fiscalizar as atividades do Congresso Nacional, cobrar e reivindicar. Só com pressão popular será possível mudar os hábitos da velha política. Temos o que comemorar, mas outras questões preocupam. Crescimento econômico por si só não proporciona desenvolvimento sustentável. As pessoas também precisam de saúde, educação e cultura. Afinal, de que vale um país economicamente pujante com um povo ignorante, doente e sem identidade? Que em 2020 possamos olhar para frente, com avanços e sem retrocessos.