Saiba o que pode causar o colapso na função dos rins

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A doença renal crônica (DRC) afeta boa parte da população. De acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), a cada 1 milhão de brasileiros, 400 estão em programa de hemodiálise – filtragem do sangue através de uma máquina – em função do problema. E esse número aumenta em média 8% a cada ano. Muito se tem ouvido falar em doença renal, nos últimos dias, devido ao fato de Pelé ter dado entrada num serviço de emergência graças a uma infecção urinária, quadro que foi evoluindo até que tivesse de ser submetido à hemodiálise. O que o maior jogador de futebol de todos os tempos teve está sendo comparado a um ataque cardíaco – só que do rim.

É uma doença que pode ser prevenida, e que requer mais atenção especialmente se a pessoa tiver apenas um rim, como é o caso de Pelé. Especialistas alertam que basta um exame simples e de baixo custo para diagnosticar precocemente a doença renal crônica. De acordo com a SBN, este é um mal que se desenvolve de forma silenciosa. Apenas 30% da população sabe do seu diagnóstico. Na maioria dos casos, o diagnóstico é feito já em estágio avançado, quando as únicas alternativas de tratamento são hemodiálise e transplante renal. Descoberta de forma precoce, é possível tratar e manter a doença sob controle.
A insuficiência renal aguda que se observou em Pelé se originou por conta de um cálculo (pedra) ureteral, que migrou do rim para o ureter, bloqueando seu funcionamento. "Para prevenir um quadro desse, basta realizar o acompanhamento e jamais se descuidar das principais doenças causadoras do problema, deixando-as evoluir sem acompanhamento e orientação médicas", afirma o urologista Ruy Nogueira Barbosa, membro Sociedade Brasileira de Urologia (SBU).
Desencadeadores da doença renal
O médico rio-pretense Ruy Nogueira Barbosa explica que, no caso de um paciente idoso, tudo se agrava. Mas, no dia a dia, é possível observar os riscos da doença renal mais claramente quando a pessoa é portadora de diabetes e tem hipertensão arterial. A pressão alta leva ao estreitamento dos vasos dos rins, e os néfrons (espécie de filtros nos rins) vão sendo destruídos progressivamente por falta de irrigação. Essa condição leva a consequências graves e diversas, como, por exemplo: anemia, pois o rim produz um hormônio que estimula a produção de glóbulos vermelhos na medula óssea; doença óssea, pois a vitamina D mais ativa é produzida no rim; intoxicação, pois várias substâncias que ingerimos ou produzimos são eliminadas pelos rins, e o acúmulo de líquido no corpo, com inchaço e elevação da pressão arterial.
Barbosa acredita que, no caso do Pelé, o que pode ter complicado sua vida, além dos problemas que normalmente antecedem a doença renal, e o próprio fato de ter só um rim, é ele ser idoso e possivelmente portador de hipertrofia prostática – doença benigna comum com o avanço da idade. De acordo com o médico, ele deve ter apresentado inicialmente a infecção urinária que evoluiu após a manipulação cirúrgica endoscópica do cálculo para um processo infeccioso, e culminou em infecção urinária generalizada (sepse urinária) e falência da função renal desse rim único, necessitando de suporte dialítico para recuperação da função renal e do uso de antibioticoterapia de largo espectro para por fim à infecção urinária.
Equipamento menos agressivo
Em geral, quem necessita de hemodiálise para sobreviver a uma doença renal crônica só se livra do tratamento após realizar o transplante de rins. E submeter-se ao processo de hemodiálise é um transtorno. De acordo com dados da SBN, cerca de 10% dos internados podem desenvolver a infecção renal aguda e precisar da hemodiálise. No entanto, Pelé, que está sendo atendido por um dos melhores hospitais do País, o Israelita Albert Einstein, está utilizando um novo equipamento para a realização da filtragem sanguínea, que faz o processo de forma mais suave, e é indicado para pacientes com insuficiência renal aguda em estado grave.
Segundo o nefrologista Emmanuel Burdmann, membro da Comissão de Injúria Renal Aguda da Sociedade Internacional de Nefrologia (ISN, na sigla em inglês), a diferença entre as máquinas de hemodiálise comuns e a que foi utilizada no caso do Pelé, de acordo com os boletins do hospital, é que "o aparelho realiza a filtração do sangue com menor agressividade, aumentando os níveis de segurança do procedimento". O médico esclarece que essa máquina, referência em tecnologia no mercado, foi desenvolvida justamente para casos semelhantes ao de Pelé. "É um tipo de diálise contínua (lenta), que pode ficar em funcionamento durante dias. A máquina possui regulagens e dispositivos que a tornam mais segura neste tipo de situação", diz o especialista.
SAIBA MAIS
A calculose urinária ocorre em 10% da população e sua recorrência chega próximo a 50% se não forem introduzidas medidas adequadas de tratamento
A insuficiência renal aguda afeta entre 5% e 7% de todos os pacientes internados e 30% dos internados em UTI, e as principais causas, hoje, são: diabetes mellitus e hipertensão arterial. O paciente pode evoluir para necessidade de realização contínua de hemodiálise – filtragem do sangue por máquina – e a função normal dos rins só retorna por um transplante renal
Creatinina
A creatinina é um metabólito que circula pelo sangue e serve como um marcador do funcionamento dos rins. É derivada da creatina, substância produzida pela musculatura que, ao transformar-se em creatinina, deve ser eliminada pelos rins – O valor da creatinina em indivíduos normais apresenta uma variação em relação ao sexo e ao volume de massa muscular. A sua concentração no sangue é maior nos homens e nos atletas. Nas mulheres, crianças e idosos, a concentração sanguínea é proporcionalmente menor. Seus valores aumentam à medida que ocorre a diminuição da função dos rins; por isso, são utilizados como marcadores da função renal. Os aumentos se tornam significativos quando existe perda de mais de 50% da função dos rins
Fonte: Ruy Nogueira Barbosa, urologista de Rio Preto e membro Sociedade Brasileira de Urologia (SBU)


A seguir entrevista com o urologista Miguel Zerati Filho, do Hospital de Base de Rio Preto, do Instituto de Urologia e Nefrologia (Iun), de Rio Preto e membro da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), sobre o assunto que envolve o rei do futebol, Pelé.
Diário – O que pode nos dizer sobre a doença que envolve o Pelé?
Miguel Zerati Filho – O que nós sabemos é que o Pelé fez a retirada de um rim há muitos anos devido a um tumor renal, evoluiu bem, curado da sua doença, porem com rim único. No mês passado, quando foi hospitalizado pela primeira vez no Hospital Albert Einstein, com fortes dores abdominais e vômitos (as famosas “cólicas renais”, que só quem teve, sabe o quanto dói), foram diagnosticadas várias “pedras” tanto no rim, como no ureter e bexiga. E após a realização de exames, foi submetido a cirurgia endoscópica, ureterolitotripsia e cistolitotripsia a laser (procedimentos rotineiros que fazemos habitualmente em Rio Preto), com boa evolução. Ele permaneceu com um cateter interno (duplo J – também disponível em Rio Preto), que vai do rim a bexiga para drenagem da urina e diminuição do edema (inchaço) interno e eventual infecção urinária. Como o Pelé tinha múltiplos cálculos, dores intensas, vômitos, provavelmente este quadro leva a algum grau de lesão renal e infecção. Ele foi operado em caráter de urgência, menos de 24h após sua hospitalização e a cirurgia deve ter sido complexa e demorada (vários cálculos em lugares diferentes). Além disso, sua idade, 74 anos, por si só já causa uma perda da função renal (além do rim único). É importante lembrar que, recentemente, tinha passado por grande cirurgia de prótese de quadril, tendo ficado restrito por um período. Todo paciente que fica imobilizado, seja por acidente, fraturas ou doenças tem uma probabilidade maior de desenvolver cálculos, pois o repouso acarreta uma desmineralização cálcica dos ossos, que podem migrar para os rins, formando cálculos. No caso do Pelé o que aconteceu foi uma insuficiência renal aguda (leia mais sobre a doença, abaixo), decorrente de um quadro de infecção generalizada (septicemia), que chegou a deixá-lo instável, isto é, a pressão arterial caiu e foi mantida por medicamentos específicos. Com o controle da infeção, houve uma estabilização geral, inclusive do rim.
Diário- Qual o percentual de pessoas com problema renais no Brasil, hoje?
Zerati Filho – Em torno de 5% da população apresenta pedras nos rins. Em geral, o problema está associado a questões hereditárias, distúrbios metabólicos (como excesso de produção de cálcio ou ácido úrico). Elas são mais frequentes em adultos jovens, mas principalmente em homens; embora possa acometer crianças e idosos em qualquer idade.
Insuficiência renal
As estatísticas variam, mas sua incidência tem aumentado mundialmente. A doença crônica incide entre 28 a 46% dos pacientes acima de 65 anos. Estima-se que 500 milhões de pessoas no mundo tenham alguma doença renal, aguda ou crônica e, que; 1,5 milhões de pessoas necessitem de diálise (filtragem do sangue). No Brasil, os dados são preocupantes, cerca de 10 milhões de pessoas tem doença renal crônica, mas a maioria desconhece seu problema. A incidência é maior no idoso, porém acomete crianças e jovens; pois cerca de 1,5% da população entre 0 e 19 anos sofre de doença crônica e necessita diálise.
Diário – O que vem a ser a injúria renal é o mesmo que insuficiência renal?
Zerati Filho – Injúria renal é um termo leigo que é melhor definido como insuficiência renal. Essa por sua vez, tanto pode ser aguda, quanto crônica. A aguda acontece de forma súbita e, na maioria das vezes, é reversível; e a crônica implica na falência lenta e gradual do funcionamento renal. O diferencial é que no caso da crônica ela é irreversível e necessita terapia substitutiva, que são os métodos dialíticos (hemodiálise – pelo sangue; ou diálise peritoneal – pela barriga). As diálises são feitas de forma continuada nos pacientes crônicos, e nos agudos até o retorno das funções renais do rim. Na insuficiência renal, como o nome já diz, os rins perdem seu funcionamento, isto é deixa de ser capaz de eliminar resíduos e líquidos do organismo, além de outros elementos químicos do sangue como sódio, potássio, fósforo e cálcio. Além de eliminar medicamentos, toxinas do organismo. Eles também têm a função de liberar hormônios no sangue que regulam a pressão arterial, a produção de glóbulos vermelhos e fortalecer os ossos.
Prevenção
Diário – Qual a participação da creatinina nos rins e que tipo de exame se faz para identificar?
Zerati Filho – Creatinina é o exame de sangue mais útil para avaliar a função renal. Se a creatinina se eleva, significa que a filtração glomerular (a função do rim) está comprometida. Muitas pessoas podem ter um rim perdido e o outro lesado e ainda assim manter a creatinina normal, pois com apenas 1/3 de um rim podemos viver normalmente com taxas de creatinina normal. Quando ocorre a insuficiência renal aguda (como a do Pelé) ou a crônica, os níveis de creatinina se elevam. E, mais grave é o comprometimento renal, quanto mais elevada for a taxa de creatinina.
Diário – Qual a melhor forma de prevenção dos rins?
Zerati Filho – Tudo que é bom para o coração é bom para o rim. Alimentação saudável e balanceada, evitar excessos de gorduras, frituras e sal; atividade física regular, evitar a obesidade, principalmente, a abdominal. Tratar com muito rigor e manter em níveis normais as doenças crônicas. Até porque a diabetes e a hipertensão arterial são as causas mais frequentes de insuficiência renal crônica, principalmente, se não forem rigorosamente controladas. Além de parar de fumar, álcool com moderação e evitar a auto medicação sistemática com analgésicos e anti-inflamatórios. Para a prevenção de cálculos renais é fundamental ingerir bastante líquido, principalmente água de boa qualidade. Após os 50 anos, avaliação médica rotineira com exames anuais.
Diário – Há outras doenças além da diabetes e pressão alta que podem afetar os rins?
Zerati Filho – A calculose renal se não for convenientemente tratada também é uma causa de insuficiência renal e também a senilidade, pois os idosos tem gradativamente uma perda de função renal, semelhante ao que ocorre em outros órgãos, como audição, visão, muscular, entre outros.
Diário – Quais exames que devem ser utilizados para se evitar surpresas?
Zerati Filho – Após os 40 anos, para quem já está no grupo de risco, ou seja, tem fatores como: hereditariedade, obesidade, sedentarismo ou tiver algum sintoma, e após os 50 anos para todos é ideal fazer uma avaliação anual. Para quem não tem qualquer sintoma é possível realizar o ultrassom abdominal (avalia tudo, inclusive rins) e exames laboratoriais de sangue (inclui a creatinina, glicose, colesterol, triglicérides, etc.) e urina. Além disso, uma avaliação cardiológica para uma prova de esforço, a ergometria (andar ou correr na esteira) enquanto é feito um eletrocardiograma.
Fonte: Diário Web – 10/12/2014
 

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