Não era a profissionalização dos pacientes que a técnica de enfermagem Liane Ribeiro da Páschoa buscava quando implantou um coral no hospital Santa Lucinda. A ideia era amenizar a dura rotina de quem passa, semanalmente, 12 horas ligado a uma máquina, no Centro de Diálise e Transplante Renal do hospital, e a música pareceu ser um bom caminho. "Eles só vinham para cá fazer a diálise, três vezes por semana, em sessões de quatro horas. Muitos, por conta dessa rotina, não fazem outra atividade, então passam a se sentir inúteis. Pensei no coral para que eles tivessem outra relação com o hospital, e uma ocupação a mais", explica Liane que, há três meses, deu início ao projeto cuja estreia acontece hoje, no próprio hospital.
A escolha da música como uma atividade e terapia extra não nasceu por acaso. A técnica de enfermagem já trabalha com musicalização na igreja que frequenta e, antes, os pacientes já participavam de um momento musical que era proporcionado pelo grupo Elo, e o resultado sempre foi muito positivo. "Então pensei em trabalhar outra atividade, e resolvi fazer o coral também pela proximidade do Natal", explica ela que, daí em diante, começou a convidar as pessoas para formar o coral.
Há mais de quatro anos realizando sessões semanais de diálise, José Carlos da Silva, 47 anos, de Iperó, não pensou duas vezes quando recebeu o convite de Liane. "Se não der para fazer nada, que fique em casa mesmo. Mas se ainda dá, tem que fazer alguma coisa. Não dá para ficar só reclamando da vida", ensina ele, que vê o coral como um reforço ao tratamento, já que trabalha ainda a autoestima.
Além dos pacientes, funcionários do local também participam do coral, para estreitar os vínculos e engrossar o coro, que já conta com cerca de 30 pessoas. Muitos dos pacientes não moram em Sorocaba e viajam semanalmente, tanto para o tratamento como para os ensaios. De acordo com Liane, não há corpo mole quanto à agenda de compromissos. "Eles nunca faltam, são muito participativos. Muitos ficaram depressivos depois do diagnóstico e do tratamento, pois tiveram que mudar de vida. Agora, não perdem essa oportunidade de fazer alguma coisa."
Mudança de vida
Aos 58 anos de idade, e há um ano e meio em tratamento, José Benedito Martins de Souza é um dos mais entusiasmados com o coral e animado com a apresentação de hoje. Ele, que vem de Porto Feliz semanalmente, defende ainda a aproximação entre pacientes e profissionais da saúde, desde que iniciaram os ensaios. "A partir do momento em que a gente fica encostado, a gente perde os nossos valores. Voltei a me sentir útil, e eu nem sabia que eu sabia cantar", brinca ele ao contar que o mel o ajudaria a manter o vozerão para a estreia.
Mas o coral que apresentará canções natalinas também conta com variações de timbres femininos, como o de Valéria Almeida Martins, 44, de Iperó. Valéria é professora e, há seis meses, quando recebeu seu diagnóstico, teve que se adaptar a uma mudança radical na rotina. Nesse momento delicado, a nova atividade tem sido fundamental. "Aceitei o convite para participar pois toda experiência na vida tem seu valor. E a vida continua."
Fabiana Campos, 34, e Isabela Gonçalves Mendes, 21, são prova disso. Há mais de um ano fazendo tratamento, as coralistas dividem a rotina com os estudos. "O tratamento fica mais leve, é um momento de descontração", defende Fabiana. Isabela concorda: "Ficamos mais alegres, tudo melhora."
"A música alegra o coração. É como se eles não tivessem nenhuma doença, tamanha a disposição no envolvimento com o projeto", explica a técnica de enfermagem.
As apresentações acontecem hoje e amanhã, às 9h, 11h30 e 16h, no Centro de Diálise do hospital Santa Lucinda. A cada apresentação serão cantadas quatro canções natalinas.
Fonte: Cruzeiro do Sul – 19/12/2013