Sertão: omissão provoca morte de paciente renal

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Secretária de Piranhas teria negado ajuda para hemodiálise de paciente.
Familiares de um jovem de 29 anos que era doente renal crônico e faleceu no último dia 25 em Piranhas vão ao Ministério Público denunciar a Secretaria de Saúde do município por omissão. A viúva e irmãs de Evanilson Galdino da Silva acusam a secretária Iranny Mesquita de haver se negado a fornecer combustível para que ele pudesse se deslocar, de moto, até o hospital Chama, em Arapiraca, onde realizava sessões de hemodiálise três vezes por semana.

Portador de insuficiência renal crônica, Evanilson vinha se submetendo à hemodiálise como terapia renal substitutiva desde 9 de maio de 2012 no Centro Hospitalar Manoel André (Chama), localizado em Arapiraca, e considerado um hospital de referência nas regiões do Agreste e do Sertão de Alagoas.Agricultor e pai de quatro filhos, com a esposa prestes a ganhar o quinto, Evanilson estava inserido no programa de Tratamento fora do Domicílio (TFD), instituído pela Portaria 055/1999 da Secretaria de Assistência Básica do Ministério da Saúde.
Pelo programa, os portadores de doenças crônicas recebem uma ajuda mensal para realizar o tratamento fora do município e até do estado em que residem quando este não oferecer as condições para isto. Os recursos são enviados pelo governo federal, via Secretaria Estadual de Saúde, para as secretarias municipais às quais cabem a responsabilidade do cadastro dos pacientes e o depósito dos valores em suas respectivas contas bancárias.
A ACUSAÇÃO
A viúva do jovem, Maria Cícera Lima Galdino, que está prestes a completar nove meses de gestação, conta que o marido trabalhava na roça até ter ficado doente, no ano passado, e vinha recebendo regularmente o TFD – segundo ela no valor de R$ 370,00 para ele e outros R$ 370 para ela na condição de acompanhante – até poucos meses atrás, mas que há cerca de três meses o casal passou a verificar que a quantia destinada a ela era depositada com uma diferença, para menos, de R$ 60,00.
Mas a principal acusação de Cícera e de duas irmãs de Evanilson é a de que, dois dias antes de sua morte, a Secretaria de Saúde de Piranhas se negou a fornecer combustível para que ele pudesse se deslocar até o hospital Chama para se submeter à hemodiálise. Evanilsa Rosa da Silva e Rosângela Rosa da Silva, as irmãs, contam que na quarta-feira anterior à sua morte, no dia 21 de agosto, ele só conseguiu se deslocar ao hospital porque a família percorreu as ruas pedindo ajuda para completar o dinheiro para abastecer a moto.
A família também afirma que a secretária Iranny Mesquita teria dito textualmente que “lavava as mãos” em relação a Evanilson, porque ele estaria muito rebelde. Rebeldia esta que teria motivado o desligamento do jovem da turma de pacientes transportada em um veículo da secretaria, no horário da manhã e três vezes por semana, até o Chama para tratamento. Segundo Evanilsa, a alegação seria a de que ele estaria usando drogas e com um comportamento violento, o que a família nega com veemência.
Na sexta-feira, dia 23 de agosto, Evanilson estava se sentindo muito mal e inchado, de acordo com a esposa, o que a levou a ir até a Secretaria de Saúde e pedir à secretária que desse uma ordem liberando o combustível para a moto. Segundo ela, mais uma vez Iranny Mesquita teria dito que “lavava as mãos”.Depois de quase três dias com muitas dores e vomitando, Evanilson morreu no domingo, 25 de agosto, às 10h30. Sua certidão de óbito atesta como causa da morte “descompensação metabólica e insuficiência renal crônica”.Por conta das acusações de que Evanilson estaria tendo um comportamento agressivo devido ao uso de drogas, a família obteve do hospital uma declaração, assinada pelo diretor-administrativo, Indalécio Magalhães, segundo a qual “nunca foi registrado em seu período de tratamento qualquer problema de relacionamento com os médicos, funcionários e pacientes”.
A denúncia da família será formalizada na próxima terça-feira à promotora substituta de Piranhas, Adriana Accioly, com pedido de apuração quanto às possíveis responsabilidades do município pela morte do jovem. Evanilson faleceu deixando quatro filhos – três meninas e um menino – e a esposa grávida de mais uma menina. A filha mais velha tem 10 anos.
CONTRA O PREFEITO
As irmãs de Evanilson também acusam o prefeito de Piranhas, Dante Alighieri Salatiel de Alencar Bezerra de Menezes (PDT), conhecido em toda cidade apenas como Doutor Dante, de omissão. Médico e casado com Simone Bezerra, uma médica que também é vereadora, ele não teria dado importância ao caso, embora, afirmam, tenha pedido e recebido, na eleição de 2012, 64 votos dos familiares do jovem. “Devolveram o favor da família com a vida do meu irmão”, afirma Evanilsa.
Ainda segundo ela, o prefeito teria agido “de forma desumana, covarde e infeliz, abandonando toda minha família que o ajudou a se eleger para que ele pudesse mudar os destinos de Piranhas”.As tentativas de contato com o prefeito, na última quarta-feira, se mostraram infrutíferas. No noticiário regional ele tem sido constantemente citado por decisões apontadas como polêmicas, dentre elas a que colocou fim à distribuição gratuita de leite para crianças carentes. Em projeto enviado à Câmara de Vereadores, ele sugere a criação do “Bolsa Leite” no valor de R$ 50 por mês.Mais polêmica tem sido a troca constante de sua equipe. Em nove meses de gestão, Iranny Mesquita é a terceira pessoa a comandar a Secretaria Municipal de Saúde.
SECRETÁRIA DE SAÚDE
A secretária de Saúde de Piranhas rebate as acusações e diz acreditar que a família de Evanilson, principalmente a esposa, esteja reagindo à dor da perda do ente querido. Ainda assim, ela garante ter testemunhos das queixas que recebeu sobre o jovem, bem como toda a documentação relativa ao pagamento do TFD no município e cujo valor, segundo ela, é de R$ 900 para cada beneficiário, sem discriminação de quem seja o acompanhante.
De acordo com Iranny Mesquita, Evanilson Galdino foi desligado da turma que é levada nas manhãs das segundas, quartas e sexta-feiras para tratamento no Chama a pedido do próprio médico da equipe de nefrologistas do hospital porque estaria tendo um comportamento rebelde, ao não obedecer à dieta alimentar e estar ingerindo bebida alcoólica. “Quando falei em rebelde, era neste sentido, e creio que a família interpretou de forma equivocada, pensando que eu estava falando de atitude agressiva”, diz.Sobre a afirmativa de que teria se negado a liberar a ordem para abastecer a moto de Evanilson, diz que se recorda de na sexta-feira (23 de agosto) ter sido procurada pela esposa do jovem e ter lhe pedido que aguardasse o retorno do chefe de Transportes (que havia se ausentado da secretaria), mas que a mesma foi embora.
Iranny garante não ter sido comunicada que Evanilson estava passando mal. “Temos o Samu aqui, ambulância do município, uma Unidade Básica de Saúde e um hospital estadual; qualquer um destes serviços teria sido acionado”, afirma.“No caso de portadores de doenças crônicas que residem nas cidades onde não existe o tratamento, as prefeituras têm a opção de efetuar o transporte do paciente e acompanhante por sua própria conta ou fazer o repasse do TFD e nós optamos por fazer os dois, ou seja, além de pagar o TFD, temos uma van que leva para Arapiraca e traz de volta para Piranhas 18 pacientes”, diz.A distância entre Arapiraca (distante 126 km de Maceió) e Piranhas (que faz divisa com Canindé do São Francisco, em Sergipe) é de 121,7 km, e pode ser percorrida em uma hora e 48 minutos de carro.
Fonte: Jornal Extra de Alagoas – 18/09/2013

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