Gadgets e aplicativos de consumo podem ajudar a melhorar o atendimento ao paciente, reduzir a carga de trabalho dos médicos e incentivar um estilo de vida mais saudável
Não é possível mudar um estilo de vida em apenas 10 minutos em um consultório que parece uma cela. Ainda assim, todos os dias vemos médicos entrando felizes nessas salas de exames como se fossem hamsters bem-pagos, atendendo 20, 30 ou mais pacientes. Gastamos 10 minutos de consulta, comendo pelas beiradas das condições e das doenças relacionadas ao estilo de vida, com pouco efeito.
Os resultados dessas visitas apressadas podem incluir “diminuição da satisfação do paciente, aumento dos retornos ou prescrições inapropriadas”. As fórmulas de reembolso encorajam os médicos a desempenharem procedimentos mais lucrativos.
Desfazer anos de estilo de vida que não visa a saúde exige um profundo envolvimento na vida do paciente – muito além do que é possível realizar em uma visita de 10 minutos a um consultório. Também exige pedidos de muitos mais dados do que os inseridos em registros médicos eletrônicos. Os médicos precisam de Big Data para estabelecer uma relação mais significativa com os pacientes e ajudá-los a empreender mudanças no estilo de vida para melhorar a saúde, reduzir doenças e baixar custos.
Também exige um contato mais frequente do que os breves encontros em consultórios claustrofóbicos. (Além do mais, quem quer trabalhar em espaços tão confinados?) De fato, um estudo mostrou que os médicos gastam, em média, 1,3 minutos em busca de informações cruciais do paciente sobre sua condição e tratamento durante as consultas.
Enquanto isso, uma grande onda de aplicativos de smartphones e dispositivos de autorrastreamento podem nos ajudar para ir ao encontro da melhoria da saúde e gerenciamento de doenças. Esses aplicativos e dispositivos estão começando a gerar ferramentas que facilitam essas mudanças. Eles geram exatamente o tipo de dados que os médicos precisam para ajudar os pacientes a passarem pelas mudanças necessárias de estilo de vida – as mesmas mudanças que recitamos no final de cada consulta, muitas vezes quando o paciente está saindo do consultório.
Ainda assim, organizações de saúde e fornecedores de EMR quase que unanimemente rejeitam a ideia de incorporar esse tipo de dado – isso sem falar em permitir que seus pacientes contribuam diretamente nos mesmos EMRs em que os provedores de saúde passam horas buscando informações.
A maioria dos médicos detesta a quantidade de cursos e cliques exigidos pelos EHRs e zombam da mínima ideia de que esses sistemas podem verdadeiramente ajudá-los a reduzir a carga de trabalho. Mas, ironicamente, esses mesmos médicos também são relutantes para fornecerem acesso apropriado para os registros médicos e ainda mais céticos em deixarem os pacientes introduzirem diretamente suas informações em seus registros.
Os provedores levantam inúmeras razões para explicar o porquê de não quererem pacientes contribuindo com os dados necessários para melhorar o atendimento, mas geralmente surgem com a mesma: não é pago. Nós escolhemos não pagar por saúde, mas recompensamos generosamente o cuidado de doenças. O sistema resultante de taxa-por-serviço, penaliza a eficiência e recompensa o trabalho.
A indústria de saúde não está pronta para a inovação. Diferentemente de outras indústrias, que estão alavancando a tecnologia ao passar a maior parte da transação para o consumidor, a saúde insiste em ficar com o fardo. A saúde está feliz em surfar na marola em vez de ficar na crista da onda tecnológica.
Os médicos e a burocracia da saúde são escravos do modelo pagamento-por-serviço e do work Relative Value Unit (wRVU), usado para calcular a produtividade do médico. RVUs não são aplicáveis para dispositivos de gerenciamentos, aplicativos ou dados gerados por pacientes. Poucas organizações de saúde dão reembolso por consulta de telemedicina ou investem em gerenciamento de dados do paciente. Uma visita cara a cara é muito mais lucrativa do que uma visita virtual.
Além do mais, os consultórios do tamanho 8×10 não são projetado pra a comunicação colaborativa necessária para um ótimo atendimento que leva a uma melhor abordagem para o cuidado do paciente.
Esse mesmo sistema também desencoraja o tempo gasto para o desenvolvimento de relações com o paciente. É altamente contra o esforço cognitivo necessário para ajudar os pacientes a realizarem tarefas e procedimentos que não foram comprovados para a melhoria da saúde. A nossa indústria de “saúde” é, de fato, focada na “doença”. Para a grande maioria, os pagadores – incluindo o governo – não reembolsará os provedores de saúde por promoção da saúde ou sua otimização se não houver uma doença.
Por muitos médicos serem competitivos, se tornam uma presa fácil para a administração e seus colegas que exaltam os números RVU – é super comum um médico se referenciar à sua produção RVU em conversas. Assim, administradores depreciam atividades que não produzem RVU como “perda de tempo”. De fato, baseiam a maioria dos incentivos nessa definição de produtividade. Isso leva à exaustão, insatisfação e estresse para os médicos, juntamente com a total falta de interesse pelas ferramentas que têm grande potencial para realizarem uma mudança real na saúde de seus pacientes e nas doenças.
Uma ironia nisso tudo é que muitos desses médicos estão orgulhosamente usando esses dispositivos e usando aplicativos para melhorar sua saúde. Alguns estão até mesmo indicando-os aos seus pacientes. Mas a indústria como um todo se recusa a reconhecer essas vantagens e parece incapaz de se livrar dos consultórios claustrofóbicos que confinam nossos médicos enquanto eles veem um paciente após o outro. E lá ficarão, até o sistema de reembolso mudar.
Fonte: Saúde Web – 18/10/2013